CROMO 1- O professor “perigoso”
Era inglês e foi contratado para o IF de Alcobaça. Quando lá chegou, a recepcionista ligou-me, aflita:
– Já o viu?
– Não.
– Tem um aspecto esquisito. Usa um capote comprido até aos pés, não parece normal.
Consultei o currículo: curso superior, o ano passado tinha sido professor numa escola grega e tinham-lhe passado uma boa carta de referência. Telefonei para a Grécia. Quando ouviram o nome dele, gritaram-me numa voz assustada: “Cuidado, ele é perigoso! Tivemos graves problemas com ele!” Barafustei, indignado: “Se era perigoso, como é que escreveram uma carta destas, a recomendá-lo?”. Desculparam-se: “Foi a única maneira de nos vermos livres dele”. Eu disse “thank you” de forma irónica, devo ter acrescentado algum palavrão e desliguei o telefone.
Liguei para a agência de viagens e comprei um bilhete para Londres. Telefonei para o IF de Alcobaça, falei-lhe do telefonema para a Grécia e disse-lhe que se tinha de ir embora, que lhe pagávamos o autocarro para o aeroporto e que já tínhamos o bilhete pronto para ele regressar. Nem o deixei reclamar. Passou ainda muito tempo no IF a andar de um lado para o outro, aos urros, a gritar que não éramos bons cristãos, que não tínhamos coração Talvez tivesse razão, mas não podíamos arriscar. O seu aspecto não o ajudava nada e aquele comportamento só piorava a situação. Estávamos todos com medo e ameaçámos chamar a polícia. Sempre a protestar, acabou por ceder e pegou no bilhete. Quando o vimos embarcar no autocarro ficámos aliviados.
Não me lembro sequer do seu nome.